domingo, 11 de outubro de 2009

Robespierre, o paranoico

Megalomaníaco, o maior tirano da Revolução Francesa tinha pavor de ser assassinado e preocupava-se em excesso com os trajes que usaria ao assinar atos capitais





Natália Rangel REVISTA ISTO É Edição 2083 - 14 OUT/2009



Sempre que precisava falar em público, Maximilien Robespierre (1758-1794) sofria com contorções compulsivas nas mãos e na face e exibia um manuseio descontrolado dos óculos. A sua insegurança e timidez juvenis, assim como os maneirismos nervosos, o acompanharam na idade adulta e tornaram-se marca registrada do sanguinário tirano, que se autoproclamou "O incorruptível" e foi o idealizador do regime de terror, durante a Revolução Francesa.


O temperamento reservado, no entanto, ocultava uma personalidade vaidosa e megalomaníaca que acreditava ter o legítimo direito de legislar sobre vidas alheias. Ele assinou de próprio punho nos últimos cinco meses que esteve no poder 2.217 sentenças sumárias de execução - todas as vítimas eram acusadas de conspirar contra a Revolução. Mas a sua vaidade legislava também em questões mais prosaicas: a alfaiataria. Ele apreciava os coletes com bordados elaborados, suas roupas eram bem cortadas, o cabelo cuidadosamente arrumado e sempre usava o mesmo modelo de óculos que deveriam ter lentes esverdeadas.

Robespierre é ainda hoje uma das mais controversas personalidades da história da Revolução Francesa. Entre renomados historiadores, há quem defenda que ele foi bode expiatório dos revolucionários e que era um dos homens mais íntegros entre eles. Outros, que Robespierre forneceu as bases legais para o surgimento de um Estado moderno autoritário - e que os últimos dois séculos estão fartos de exemplos desse seu legado político. A historiadora inglesa Ruth Scurr, em seu recém-lançado livro "Pureza Fatal - Robespierre e a Revolução" (Record), concede ao biografado o benefício da dúvida. Ela narra a trajetória de Robespierre, de advogado provinciano a líder revolucionário influente, obcecado por justiça e que tinha um medo paranoico de ser assassinado.

Toda a arquitetura do regime de execuções sumárias, sem direito à defesa, criada por Robespierre foi movida pelo pânico que ele vivia de sofrer represálias por parte dos "não patriotas", forma como ele se referia aos críticos do regime. Segundo a autora, Robespierre encerrava uma grande contradição: autor de diversos discursos contra a pena de morte, ele criou uma lei para aplicá-la a quem considerava suspeito. Para Robespierre todos os suspeitos constituíam um risco de vida eminente a sua pessoa e à Revolução. Na avaliação que faz dos dois últimos anos de vida do "Incorruptível", Ruth retrata um homem que, pode ter sido, de fato, incorruptível em sua vida privada, mas corrompeu-se profundamente no poder. E mostra como os mais nobres princípios podem facilmente se transformar num fanatismo letal.

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